terça-feira, 22 de agosto de 2023

O potencial da Economia Prateada

 


Economia Prateada, um mercado potencial

Marina Prieto (*)

Estima-se que pessoas com mais de 65 anos compõem 17% da faixa dos 5% mais ricos do Brasil, segundo estudo de mercado. E 66% deles têm como prioridade aproveitar a vida, de acordo com uma pesquisa do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC).

Esses dados mostram por que a economia prateada tem ganhado reconhecimento global como uma tendência significativa: há muitas oportunidades para os empreendedores brasileiros explorarem nesse segmento. À medida que o envelhecimento da sociedade se torna uma realidade, mais portas se abrem para que serviços inovadores surjam para atender suas necessidades.

É fato que as empresas que focarem nesse público podem ter um importante diferencial competitivo nos próximos anos. Mas embora o fenômeno da economia prateada seja uma realidade global, sua adoção e implantação dependem consideravelmente de uma série de fatores.

Infelizmente, ainda persistem estereótipos negativos ligados aos idosos. Ao contrário do que muitos acreditam, essa faixa da população não é formada por velhinhos fragilizados, ranzinzas e que sempre precisam de ajuda - aliás, essa é uma imagem totalmente distorcida da realidade. Outra ideia errônea a respeito da geração prateada é que eles são resistentes à tecnologia e não possuem interesse em atividades modernas - percepções que não correspondem à realidade diversificada dos idosos.

Na América Latina, pesquisas mostram que a geração prateada tem características comportamentais distintas, como apego aos valores tradicionais e aos papéis de sustento financeiro e emocional nas famílias. Esse padrão reflete a influência cultural dos baby boomers, geração que valorizou a estabilidade profissional e a dedicação ao trabalho, muitas vezes em detrimento das relações familiares mais estreitas.

Essas pessoas são muito importantes para o país economicamente, sendo responsáveis por movimentar impressionantes R 2 trilhões anualmente. Entretanto, surfar essa onda é um privilégio de quem compreende mais profundamente com quem estão lidando e é capaz de traçar as melhores estratégias para abordá-los.

Observo que já existe uma mudança de paradigma em curso, com empreendedores e empresas reconhecendo cada vez mais que a economia prateada pode ser muito mais frutífera se for praticada de maneira sensível e respeitosa. Isso pode ser alcançado por meio de uma comunicação autêntica e direta, que mostre produtos e serviços acessíveis, de alta qualidade e atrelados à incorporação de valores tradicionais, somados às experiências pessoais nas marcas oferecidas.

A chave está em compreender as necessidades e aspirações individuais dos idosos e oferecer soluções que melhorem sua qualidade de vida, promovendo saúde, independência, aprendizado contínuo e engajamento social.

Em um país onde a população idosa está crescendo de forma constante, a economia prateada se apresenta como uma oportunidade valiosa e, ao mesmo tempo, uma responsabilidade social. Vemos os empreendedores brasileiros se esforçarem para abraçar essa tendência global. Eles têm a chance de inovar e querem contribuir para o bem-estar dos idosos e prosperar em um mercado em expansão. Mas é preciso ouvir, compreender e atender às necessidades únicas dessa geração prateada que está redefinindo a dinâmica econômica do Brasil.

(*) É professora de Contabilidade da ESEG - Faculdade do Grupo Etapa.

Ilustração: El País.

quinta-feira, 3 de agosto de 2023

Quais os limites da IA?

 


Inteligência Artificial “ressuscitando” os mortos: isso é permitido

Bárbara Fraga (*)

A rápida evolução das tecnologias de Inteligência Artificial (IA) trouxe consigo uma série de questões éticas complexas. Entre elas, está o debate em torno da criação de deep fakes - técnica que utiliza imagens ou sons humanos feitas por meio de IA. Um exemplo dessa técnica é o recente caso da propaganda da Volkswagen, em que aparece a cantora Elis Regina, morta em 1982, ao lado da filha, a também cantora Maria Rita, em uma cena ultra realística, a qual as duas cantam o sucesso de autoria de Belchior, ‘Como Nossos Pais’. Por mais que o vídeo tenha remetido uma emoção sem igual, tendo em vista que Elis morreu antes de ver a própria filha crescer, é fundamental refletir sobre as implicações éticas e morais dessa prática, uma vez, também, que ainda não dispomos de uma legislação aprovada que ampare este tipo de caso. Embora os deep fakes tenham o potencial de serem usados de forma criativa e divertida, eles também podem ser uma ferramenta poderosa para disseminar informações falsas, difamar pessoas, criar pornografia não consensual, manipular vídeos para fins de fraude, entre outros. Essas situações podem prejudicar a confiança e a credibilidade de pessoas e/ou marcas. Tudo isso porque a deep fake, por meio da IA, combina algoritmos de aprendizado de máquina e processamento de imagem a fim de criar conteúdo falso e realista - geralmente vídeos - nos quais rostos, vozes e movimentos são manipulados de forma a parecerem autênticos. No entanto, são trabalhados totalmente de forma fictícia e, como no caso da Elis, sem o consenso direto da pessoa. Diante da grande repercussão, o Conar (Conselho Nacional de Autorregulação Publicitária) abriu uma representação ética contra a campanha da montadora de veículos a partir das denúncias de consumidores que questionam o uso da IA para fazer a propaganda de quem já morreu. A contestação também reflete que a utilização da imagem da cantora pode trazer confusão entra a ficção e a realidade, principalmente entre os mais jovens. Nesta discussão, que promove uma série de questionamentos éticos e morais, vale abordar que, em primeiro lugar, essa ótica impulsiona a questão do consentimento e privacidade da pessoa, dona da imagem utilizada. O falecido não pode mais expressar sua vontade em relação ao uso de sua imagem em deep fakes e é crucial respeitar seus desejos prévios quando disponíveis. Além disso, a disseminação sem consentimento pode violar a privacidade e a dignidade do mesmo, bem como causar angústia emocional aos entes queridos que mantêm a memória do indivíduo. Diante dessas considerações, é fundamental que os criadores e usuários de deep fakes de pessoas falecidas ajam com responsabilidade, respeitando os desejos e direitos da pessoa, conforme o que ela expressava ainda em vida. Regulamentações específicas precisam ser criadas para garantir o uso ético dessas tecnologias, levando em conta os aspectos legais, morais e emocionais envolvidos. A conscientização sobre as implicações éticas e o diálogo aberto são essenciais para garantir que as representações digitais de pessoas falecidas sejam tratadas com respeito, dignidade e consideração por todos os aspectos que envolvem aqueles que já não estão entre nós.

(*) é Head de Data Science da A3Data, consultoria especializada em dados e inteligência artificial.

Ilustração: Radio Itatiaia.