domingo, 5 de outubro de 2025

Professor Emérito afirma que é preciso respeitar a Constituição

 A Constituição e a liberdade

Considero que a liberdade de expressão é, sem dúvida, a pedra angular da democracia. Para mim, ela é fundamental não só para que haja um debate público vibrante, mas também para garantir a pluralidade de ideias em nossa sociedade.

Apesar de todas as críticas que são feitas ao ativismo judicial e das diversas questões constitucionais em debate, eu defendo que o Brasil permanece uma democracia. E, nesse contexto, vejo a liberdade — em especial a liberdade de expressão e de defesa — como a principal arma para a manutenção do Estado de Direito. É por meio dela que podemos proteger o indivíduo da opressão e do silenciamento.

Homenagem e a Defesa da Liberdade
Recentemente, a Reunião do Conselho Superior de Direito da Fecomercio-SP foi dedicada à homenagem que intelectuais brasileiros — incluindo juristas, economistas, jornalistas e profissionais de diversas áreas — fizeram aos meus 90 anos, com o lançamento do livro "A Constituição e a Liberdade".

A obra foi coordenada pelo jurista Professor Doutor Modesto Carvalhosa e pelo economista Professor Doutor Luciano de Castro. O livro reúne 54 artigos de expressivos intelectuais brasileiros, com contribuições de autores como o ex-presidente Michel Temer; o ex-candidato à presidência da República Luiz Felipe D’Avila; o deputado federal Luiz Philippe de Orléans e Bragança, um dos mais ativos da nossa Câmara Federal; Manoel Gonçalves Ferreira Filho, o maior constitucionalista do Brasil; os economistas Marcos Cintra e Paulo Rabello de Castro e os jornalistas J. R. Guzzo (in memoriam), Paula Leal e Ana Paula Henkel.

O lançamento contou com a presença e palestras de diversos autores, como Modesto Carvalhosa, Paulo Rabello de Castro, Manoel Gonçalves Ferreira Filho, Tiago Pavinatto, Luciano de Castro, Angela Vidal Gandra da Silva Martins, Luiz Philippe de Orléans e Bragança, Almir Pazzianoto e André Marsiglia, que, entre outros presentes, fizeram manifestações notáveis.

Em suas palestras, todos demonstraram que a liberdade de expressão é o alicerce fundamental da democracia. Comprovaram que não há democracia em um país onde existe o receio de falar. O cenário onde a palavra pode levar à prisão e a crítica às autoridades gera risco de detenção é característico de todas as ditaduras, o que impede a existência de uma democracia genuína.

Os oradores, cada um no seu estilo e campo de conhecimento específico, defenderam com firmeza a ideia de que só a ampla liberdade de expressão é prova de uma verdadeira democracia, na qual o cidadão não precisa ter medo de falar.

Reafirmaram que, se houver abuso, a punição deve ser posterior ao ato. Em consonância com o antigo artigo 19 do Marco Civil da Internet — e não com a versão modificada pelo Supremo Tribunal Federal — e com a própria Constituição, a responsabilização pelo abuso de manifestação deve ocorrer por meio de ações judiciais e indenização por danos morais posteriormente, mas jamais em controle antecipado. Afinal, sem liberdade de expressão, a própria democracia se fragiliza.

Lembraram, ainda, que os Poderes Executivo e Legislativo são representativos do povo, enquanto o Poder Judiciário, que representa a lei, não tem essa mesma representatividade popular. Por essa razão, o Judiciário deve obedecer às determinações do povo, manifestadas por meio de seus representantes.

A principal mensagem foi a de que não devemos criticar pessoas, mas sim ideias, sempre respeitando as opiniões divergentes. Eles defenderam a ideia de que, mesmo não concordando com as decisões de uma autoridade, a crítica deve ser direcionada à ação ou ao posicionamento, e não a ataques pessoais. Trata-se, pois, daquilo que eu sempre fiz na vida: respeitar opiniões diferentes, não atacar pessoas, mas defender ideias. Essa é a verdadeira democracia.

Nesta esteira, todos os oradores defenderam o direito à palavra e à livre expressão do pensamento, com a ressalva de que a divergência deve ser dirigida às ideias e não às autoridades, demonstrando a elas respeito.

A anistia, por exemplo, deve ser para a paz, e não um instrumento para o ódio ou para a manutenção de radicalizações.

O Poder Judiciário deve ser um agente de pacificação, e não o mantenedor de um clima de insegurança. Afinal, seus integrantes são grandes juristas, mas não são políticos.

Durante a reunião no Conselho, o Poder Judiciário foi respeitado, mas criticado por seu protagonismo excessivo e pela invasão da competência de outros Poderes. Foi defendida a ideia de que a luta de todos os brasileiros deve ser pelo respeito à Constituição, pela liberdade de expressão e pela verdadeira democracia, com pleno direito de defesa. Esse é o caminho para um país realmente democrático.

Essa postura é a mesma que eu vi durante os 20 meses de debates constituintes. Ao sairmos de um regime de exceção, os Constituintes de 1988 almejavam um regime de plena democracia, com absoluta harmonia e independência entre os três Poderes.

Senti-me profundamente honrado por, aos 90 anos, ver um grupo tão importante de pensadores e intelectuais manifestar publicamente as ideias que defendemos na reunião. Era isso que eu gostaria de trazer aos meus leitores sobre o lançamento da obra "A Constituição e a Liberdade", pela Quartier Latin.

Ives Gandra da Silva Martins é professor emérito das universidades Mackenzie, Unip, Unifieo, UniFMU, do Ciee/O Estado de São Paulo, das Escolas de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme), Superior de Guerra (ESG) e da Magistratura do Tribunal Regional Federal – 1ª Região, professor honorário das Universidades Austral (Argentina), San Martin de Porres (Peru) e Vasili Goldis (Romênia), doutor honoris causa das Universidades de Craiova (Romênia) e das PUCs PR e RS, catedrático da Universidade do Minho (Portugal).

sábado, 4 de outubro de 2025

Você está treinando seu negócio para IA?

 


Você está treinando a IA para o seu negócio ou o seu negócio para a IA?

Filippo Di Cesare (*)

Você investe em IA, contrata softwares modernos e monta alguns protótipos. Três meses depois descobre que os resultados não estão à altura. Isso soa familiar? Não é que a tecnologia falhou. É que talvez você tenha treinado a IA para o seu negócio, mas ainda não treinou o seu negócio para a IA.

  • Treinar a IA para o negócio é partir de casos de uso claros: reduzir custos, acelerar processos, melhorar atendimento. Funciona, mas é limitado ao “aqui e agora”.
  • Treinar o negócio para a IA é outro jogo: envolve preparar cultura, dados, processos e até o modelo de valor da empresa para que a IA não apenas responda às dores atuais, mas permita reinventar produtos, serviços e até a forma de competir no mercado. É aceitar que o problema do cliente pode mudar e que o verdadeiro diferencial será a capacidade de se adaptar.

 
No Brasil, os investimentos em inteligência artificial (IA) devem ultrapassar US$ 1 bilhão até 2026, segundo a consultoria International Data Corporation (IDC). Um estudo recente da Gartner revela que 64% dos executivos de tecnologia em todo mundo planejam implementar IA agêntica nos próximos dois anos. Já no Brasil, até o momento, poucos projetos nesse sentido foram efetivamente iniciados. Ainda assim, o mesmo estudo indica que mais de 68% das empresas brasileiras pretendem desenvolver iniciativas com IA agêntica no mesmo período, superando a projeção de outros países. 

Mas a pergunta central não é quanto se investe, é como se investe. Estamos apenas alimentando algoritmos e automatizando tarefas, ou estamos preparando organizações para absorver e multiplicar o impacto da IA?

É necessário olhar todos aspectos para preparar uma companhia para essa novidade e esse treino envolve várias dimensões:

  • Dados como ativo estratégico (governança e confiabilidade antes de tudo);
  • Integração aberta (APIs, interoperabilidade, evitar silos);
  • Mindset de aprendizado contínuo (errar rápido, ajustar rápido);
  • Ética e governança (IA como vetor de confiança, não de risco);
  • Talento e cultura (profissionais que pensem com a IA, não apenas sobre ela).

E por onde começar?

O primeiro passo não é comprar tecnologia. É mapear um problema estratégico e relevante, no qual o impacto da IA pode ser percebido claramente e, ao mesmo tempo, preparar dados e pessoas em torno desse problema. Pequeno o suficiente para aprender rápido, mas grande o suficiente para mostrar valor. 

Esse é o “ponto de entrada”: um caso de uso com valor real que, além do resultado imediato, ajude a criar a cultura, os dados e os aprendizados para escalar a IA dentro da organização.

A pergunta então permanece: você quer apenas treinar modelos para os problemas de hoje ou preparar sua empresa para os desafios que ainda nem existem? Porque, no fim, a IA não vai apenas responder ao negócio, ela vai redefini-lo.

(*) é CEO LATAM do grupo Engineering, companhia global de Tecnologia da Informação e Consultoria especializada em Transformação Digital. Formado em Ciências Econômicas e Estatísticas pela Universidade de Bolonha, na Itália.