quarta-feira, 30 de abril de 2025

Um artigo de Bárbara Nogueira sobre o futuro do trabalho

O Futuro do trabalho já começou- E você está pronto?

Por: Bárbara Nogueira

A revolução digital já não é mais algo distante: ela está aqui, no nosso dia a dia, transformando silenciosamente (e às vezes, ruidosamente) a forma como trabalhamos, nos relacionamos com as empresas e até como enxergamos o que é “ter um emprego”. Mais do que uma era de mudanças, estamos vivendo uma verdadeira mudança de era.

A tecnologia está redesenhando as carreiras, os modelos de trabalho e até os caminhos para se construir uma trajetória profissional. Segundo o Fórum Econômico Mundial, até 2025, 85 milhões de empregos devem ser substituídos por máquinas. Por outro lado, 97 milhões de novas funções devem surgir — muitas delas ainda nem existem. Já o LinkedIn Learning aponta um dado ainda mais impactante: até 2030, 1 bilhão de pessoas no mundo precisarão ser requalificadas.

É o começo de um novo jogo. A automação e a inteligência artificial estão evoluindo numa velocidade três vezes maior do que a criação de empregos tradicionais. Mas é importante entender: a tecnologia não elimina pessoas — ela substitui tarefas. Isso muda tudo. Bancos, por exemplo, adotaram caixas eletrônicos inteligentes, liberando os atendentes para atuar como consultores. Indústrias passaram a usar robôs para soldagem e inspeção, enquanto os operadores se transformam em supervisores tecnológicos. No marketing, a IA ajuda a gerar conteúdo, mas o olhar estratégico — que interpreta os dados e entende o comportamento do consumidor — continua sendo humano.

Outro fenômeno dessa nova economia é a ascensão da "gig economy", ou economia sob demanda. Plataformas como Uber, iFood, 99Freelas e outras abriram portas para trabalhos mais flexíveis, mas também mais instáveis. O vínculo tradicional com uma única empresa está dando lugar a relações de trabalho mais fluidas, em que a segurança profissional vem, principalmente, da capacidade de se adaptar e aprender rápido.

E é justamente aí que entram as novas habilidades. No lado técnico, dominar ferramentas digitais, entender o básico de análise de dados, conhecer plataformas como CRMs ou recursos com inteligência artificial deixou de ser “um diferencial” — virou necessidade. Mesmo quem não é programador precisa compreender lógica de programação, pelo menos para se comunicar com a tecnologia.

Mas as soft skills (habilidades humanas) continuam sendo o trunfo. Pensamento crítico, criatividade, inteligência emocional, comunicação clara e vontade de aprender são características que nenhuma máquina consegue replicar. E são essas qualidades que as empresas estão procurando cada vez mais — profissionais adaptáveis, curiosos e com sede de evolução.

Hoje, o portfólio fala mais alto que o currículo tradicional. Experiências práticas, projetos entregues, aprendizados adquiridos — tudo isso conta (muito!) na hora de se destacar no mercado.

Só que essa transformação também traz um alerta: a inclusão digital ainda é um desafio enorme. No Brasil, mais de 20 milhões de pessoas não têm acesso regular à internet. As barreiras digitais afetam, principalmente, quem tem menos escolaridade, mulheres e trabalhadores mais velhos. Enquanto novas profissões surgem, muitas pessoas ainda não têm acesso às ferramentas básicas para acompanhar essa mudança.

Para quem está no mercado — ou quer entrar —, o caminho é investir em aprendizado contínuo. Plataformas como Coursera, Alura, Senai, Sebrae, YouTube e LinkedIn Learning oferecem cursos gratuitos ou acessíveis para todos os níveis. Aprender Excel, Power BI, ferramentas colaborativas e noções de dados é um excelente começo. Além disso, manter um perfil atualizado no LinkedIn, participar de comunidades, eventos e desenvolver uma mentalidade empreendedora são passos essenciais, mesmo para quem está em empregos formais.

Do lado das empresas, o momento exige ação. É hora de criar programas internos de reskilling (requalificação) e upskilling (atualização de competências), com foco no que os colaboradores podem aprender e não só no que já sabem. Redesenhar cargos, criar trilhas de aprendizado e promover inclusão digital são iniciativas que ajudam a preparar equipes para o futuro que já chegou. E o mais importante: usar dados para entender as lacunas de capacitação e agir de forma estratégica.

No final das contas, a nova regra do jogo é clara: não importa mais apenas o que você sabe, mas o quanto você é capaz de aprender e se reinventar. O trabalho mudou — e vai continuar mudando. Mas com acesso, preparo e uma dose de coragem, essa revolução pode ser uma das maiores oportunidades do nosso tempo.

(*) é Diretora, Career Advisor & Headhunter da Prime Talent, empresa presente em 27 países pela Agilium Group.

Ilustração: Walmar Andrade. 

 

sábado, 26 de abril de 2025

Artigo de Fernando Brolo sobre a necessidade da gentileza

 


O que a Inteligência Artificial pode nos ensinar sobre gentileza

Fernando Brolo ()

Recentemente, li em um artigo que Sam Altman, CEO da OpenAI, a empresa que desenvolveu o ChatGPT, informou que ser educado com chatbots gera respostas "mais colaborativas e respeitosas". Isso acontece porque os modelos de linguagem de grande escala (LLMs) foram treinados para emular interações humanas e, portanto, respondem ao tom que utilizamos.

Esta observação me fez refletir sobre como conduzimos negócios no setor de tecnologia. Não é curioso que até mesmo as máquinas respondam melhor à gentileza?

Há mais de duas décadas, quando fundei a Logithink junto com outros experientes colegas do setor, estabeleci um princípio que guia todas as nossas interações: "Se você está fazendo negócios e não está fazendo amigos, algo está errado." Este lema não é apenas um slogan bonito – é a filosofia que transformou uma pequena consultoria em um parceiro estratégico para algumas das maiores corporações do país.

O que os chatbots estão nos mostrando é algo que sempre soube intuitivamente: a qualidade da comunicação determina a qualidade da colaboração. Quando uma IA responde melhor a um pedido educado, ela está simplesmente espelhando o comportamento humano. Nas negociações e tratativas com nossos clientes, ou melhor dizendo, parceiros de negócios, percebo o mesmo padrão: abordagens respeitosas e colaborativas invariavelmente produzem resultados melhores.

No setor de TI, existe uma tendência equivocada de reduzir relacionamentos a contratos, SLAs e outras KPIs. Certamente, esses elementos são importantes, mas representam apenas a estrutura, não a essência do relacionamento. Quando nossa equipe implementa uma inovação ou desenvolve uma solução customizada para um parceiro, não estamos apenas entregando código ou infraestrutura: estamos construindo pontes de confiança. E a confiança, como qualquer engenheiro de software sabe, não pode ser programada – ela precisa ser cultivada.

É irônico que, em uma era onde a tecnologia nos permite automatizar praticamente tudo, descobrimos que o fator humano se torna ainda mais valioso. As grandes corporações com quem trabalhamos não nos contratam apenas por nossa expertise técnica – elas nos escolhem pela maneira como transformamos essa expertise em valor através de relacionamentos genuínos.

Quando Kurtir Beavers, diretor de design da Microsoft para o Copilot, explica que os LLMs foram "treinados para emular interações humanas", ele toca em um ponto crucial: mesmo as tecnologias mais avançadas estão, em sua essência, tentando replicar o que há de melhor em nós. A gentileza, a empatia, a capacidade de compreender contextos sutis – estas são características que ainda nos diferenciam das máquinas.

Há uma lição profunda no fato de que até mesmo os chatbots respondem melhor quando tratados com cortesia. Se sistemas baseados em código – projetados para serem puramente lógicos – são influenciados pelo tom da comunicação, imagine o impacto em seres humanos complexos, com emoções, aspirações e valores.

Em um mundo cada vez mais automatizado, talvez nossa vantagem competitiva mais poderosa seja justamente aquilo que nos torna humanos: nossa capacidade de conectar, de compreender e de tratar uns aos outros com dignidade e respeito.

(*)  é CSMO (diretor de vendas e marketing) e sócio-fundador da Logithink, empresa de TI.  

 

terça-feira, 22 de abril de 2025

Crõnica de Uma Nulidade Anunciada

 


CRÔNICA DE UMA NULIDADE ANUNCIADA

Por Enzo Fachini (*)

O processo penal brasileiro não é estranho a operações grandiosas, superjuízes, desequilíbrio entre partes e nulidades. Já vimos esse filme antes. Castelo de Areia, Satiagraha, Lava Jato são apenas alguns exemplos desde o início das Grandes Operações Policiais. Todas, cada uma a sua maneira, anuladas, independentemente do mérito, por atropelo de garantias.

Agora, uma nova novela jurídica se anuncia. Tal qual o Mensalão, o processo envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro e aliados deve ser transmitido em detalhes: provas de conhecimento público, sustentações orais televisionadas, votos lidos um a um pelos ministros do Supremo Tribunal Federal. Mas os primeiros capítulos dessa novela já levantam alertas.

Incomoda, desde logo, o fato de o caso tramitar no STF. A Corte mudou, em março, seu entendimento sobre o foro por prerrogativa de função. Desde 2018, o foro só se mantinha se o cargo fosse preservado e os fatos tivessem vínculo com o mandato. Agora, mesmo após a saída do cargo, crimes funcionais permanecem na Suprema Corte. Uma reinterpretação repentina -e conveniente.

Mais incômodo ainda é o processo estar sob julgamento de uma turma, e não do Plenário. A Súmula 721 do próprio STF é clara: compete ao Plenário, e não às turmas, julgar crimes atribuídos ao presidente da República. O argumento, aqui, é que Bolsonaro já não é presidente. Mas em 2021, o ministro Edson Fachin submeteu ao Plenário o julgamento que anulou os atos da Lava Jato contra Lula — também ex-presidente à época. A comparação é inevitável. E a conclusão, simples: decisões de 11 ministros são mais legítimas que de cinco, seja qual for o resultado proclamado.

As defesas também denunciam cerceamento de acesso a provas. Alegam não terem recebido documentos relevantes e, ao mesmo tempo, terem sido soterradas por milhares de arquivos. Não é difícil imaginar o desequilíbrio. Quem acusa seleciona o que sustenta sua tese. Mas quem defende precisa de tudo: e-mails, agendas, anotações, mensagens paralelas — inclusive as que revelem divergência em relação ao suposto plano golpista. Uma mensagem dizendo “Pessoal, não acho isso aqui uma boa ideia” pode não parecer, mas é importante elemento de defesa, num caso em que a prova é negativa, isso é, “não fazer” alguma coisa.

A desigualdade de armas é evidente. O Ministério Público teve mais de 80 dias entre o relatório final da Polícia Federal e a denúncia. As defesas, muito menos. Acelerador para uns, cronômetro correndo para outros.

E há, ainda, o tema das penas já fixadas aos réus pelos atos de 8 de janeiro. Não se tratava de um passeio no parque, como bem disse o ministro Alexandre de Moraes. Mas tampouco todos queriam um golpe de Estado. Dificuldade de individualizar condutas não pode justificar condenações genéricas. A coautoria exige um plano comum e contribuição concreta de cada agente. Nem com um milhão de batons se derrubam instituições democráticas.

O julgamento entrará para a história — disso não há dúvida. Mas a história também ensina: quando o processo se faz espetáculo, atropela garantias e desequilibra o jogo, o final é um só. Nulidade.

 

(*) é advogado e mestre em Direito Penal Econômico pela Fundação Getúlio Vargas (FGV/SP), membro da Comissão de Direito Penal da Ordem dos Advogados de São Paulo (OAB/SP), sócio do FVF Advogados.

 

 

quinta-feira, 17 de abril de 2025

Você precisa ter um 'Elon Musk' na sua gestão

 


Você precisa ter um 'Elon Musk' na sua gestão

Pedro Signorelli (*)

Elon Musk e Donald Trump possuem uma relação conturbada, ora se entendendo sobre algumas questões, ora se desentendendo sobre outras, em uma briga de egos onde quem ganha é quem tem mais poder. E mesmo que estejamos falando do presidente dos Estados Unidos, Musk não fica atrás quando o assunto é ter influência, tanto que foi o próprio Trump que o chamou para ser o chefe do Departamento de Eficiência Governamental.
Além disso, sendo o dono do X (antigo Twitter), Musk foi capaz de realizar um feito positivo para a campanha presidencial de Trump nas redes sociais, fazendo com que informações chegassem a um número gigantesco de usuários. Dados da Associated Press revelam que o bilionário gastou cerca de 200 milhões de dólares em apoio ao atual presidente, o que podemos considerar um claro conflito de interesses, mas isso é história para outro texto.
Enquanto rolam especulações sobre sua possível saída do governo, paro para refletir sobre as ações dele nesse tempo. Deixando de lado as polêmicas e controvérsias para analisar apenas a parte profissional, considero que Musk pode ser peça fundamental em qualquer gestão. Mas por quê? Ele é uma pessoa que tem bastante foco e clareza onde quer chegar, trabalhando principalmente por resultados, e conseguindo entregá-los.
Acredito que essa seja a forma ideal para qualquer colaborador trabalhar em uma empresa, independente de sua função. Elon Musk já esteve em diferentes companhias e atuou em segmentos distintos, adquirindo conhecimento e experiência para conseguir ter uma visão maior e melhor de cada situação, conseguindo trazer eficiência diante de adversidades, como por exemplo, a demissão em massa que promoveu no X.
Neste sentido, penso que talvez ele possua hard skills que o destaquem, além de ter uma visão de que o erro serve como um aprendizado e que o desafio pode impulsionar a ir além. Afinal, Elon Musk acabou com o ‘meme’ de que o foguete não anda de ré, pois conseguiu colocar essa ação em prática na SpaceX. Ou seja, é um storyline que faz com que as ações dele gerem valor com o passar do tempo, por meio de competência.
Aqui não estou defendendo ou julgando, mas sim expondo como algumas atitudes desta figura, que gera tanto controvérsia, conseguem ser úteis em uma gestão. Claro que Elon Musk comete erros e um dos piores, para mim, foi quando solicitou por e-mail a todos os colaboradores que enviassem uma lista de suas realizações semanais. Essa ação passou por cima de qualquer hierarquia, desrespeitando as pessoas de forma geral.

Toda companhia deve aprender a trabalhar com confiança, caso contrário, não haverá avanço. Existem outras maneiras de conseguir saber como o trabalho de cada integrante do time está impactando e gerando resultados para a empresa, não pegando as pessoas de surpresa. A liderança precisa estar atenta para conseguir orientar da melhor maneira, direcionando para onde devem ir. Ele precisava chegar aos resultados, será que considerou solicitar via processo normal para cada liderança? Será que teria as respostas a tempo?
Em situações mais graves, é preciso atuação enérgica, onde às vezes é mais importante mandar um recado do que a ação em si. Isso é responsabilidade da liderança aplicar nos momentos em que achar adequado. Não creio que temos elementos para julgar se era adequado ou necessário. Tem muita coisa que acontece por trás das cortinas. Mas precisamos aprender com estas situações, seja para aplicá-las em nosso contexto, seja para decidir, definitivamente, que não é o caso.

(*) é um dos maiores especialistas do Brasil em gestão, com ênfase em OKRs. Mais informações acesse: http://www.gestaopragmatica.com.br/

 

segunda-feira, 14 de abril de 2025

A Substituição do Humano pela IA

 


IA Generativa só vai substituir quem esquecer o que significa ser humano

Danilo Curti (*)

O medo de perder espaço para a inteligência artificial (IA) nunca foi tão palpável. Cargos tradicionais estão em xeque, e tarefas que antes ocupavam boa parte do dia de um profissional estão desaparecendo rapidamente. A automação avança a passos largos, e isso gera desconforto. Mas essa não é apenas uma revolução tecnológica; é uma oportunidade única para nos reconectarmos com aquilo que nos torna insubstituíveis.

Durante décadas, fomos treinados para cumprir funções previsíveis, repetitivas e burocráticas. Agora, a IA generativa faz isso melhor e mais rápido. O que acontece, então, com quem baseia sua relevância no cumprimento de tarefas automatizáveis? A resposta é dura, mas necessária: essas pessoas realmente correm o risco de serem substituídas. No entanto, a verdadeira revolução da IA não está em tirar empregos, mas em libertar indivíduos para expressar aquilo que as máquinas jamais poderão replicar-sua essência, suas vivências e sua capacidade única de interpretar o mundo.

O que nos torna verdadeiramente insubstituíveis
Se olharmos para a história, toda inovação que substituiu processos repetitivos abriu caminho para a criatividade e o pensamento crítico. A Revolução Industrial não acabou com os trabalhadores; transformou a forma como trabalhavam. O mesmo acontece agora. Profissionais que compreendem que seu valor vai além da execução mecânica de tarefas estão diante da maior oportunidade já vista de se reinventar e agregar o que realmente importa: humanidade.

A IA pode processar dados, gerar textos, criar imagens e até escrever códigos. Mas ela não tem intuição, empatia ou experiência de vida. Não pode compreender nuances emocionais profundas, nem criar algo genuinamente novo sem referência. O que nos torna valiosos no mercado não é a execução fria de comandos, mas nossa capacidade de questionar, imaginar, sentir e contar histórias autênticas. Esse é o diferencial humano.

Em vez de temer a IA generativa, devemos abraçá-la como aliada. Ferramentas inteligentes podem nos libertar das amarras da repetição e abrir espaço para explorarmos nossa criatividade. Um advogado, por exemplo, pode deixar de lado a formatação de contratos para focar em estratégias jurídicas mais sofisticadas. Um designer pode automatizar ajustes técnicos e investir mais tempo na concepção de ideias inovadoras. Um jornalista pode usar IA para compilar dados e se concentrar na análise crítica das informações. Em todos os setores, a inteligência artificial está nos oferecendo uma chance única de elevarmos o nível do que produzimos.

O verdadeiro risco não é ser substituído pela IA, mas insistir em se comportar como uma máquina. Quem entender que seu valor está naquilo que nenhuma tecnologia pode replicar terá um futuro brilhante. Criatividade, sensibilidade, visão estratégica, empatia—esses são os elementos que nos diferenciam e garantem nossa relevância em qualquer cenário de transformação digital.

Estamos vivendo um momento decisivo. Podemos lutar contra o inevitável e nos prender a funções que estão desaparecendo ou podemos usar essa revolução a nosso favor. Nunca houve uma oportunidade tão clara para nos libertarmos das tarefas automáticas e finalmente contribuirmos com aquilo que temos de mais singular: nossa essência humana.

 

(*) é cofundador e Diretor de Operações da Evollo. Bacharel em Engenharia pela Unicamp e com MBA em Marketing pela USP, Danilo possui mais de 10 anos de experiência liderando implantações e operações em algumas das maiores empresas do Brasil

Ilustração: Zaapts.

sexta-feira, 11 de abril de 2025

Como a mobilidade vai revolucionar a gestão documental

 


Por Inon Neves (*)

Seja aprovando um contrato urgente pelo smartphone no saguão do aeroporto ou acessando um relatório confidencial durante uma viagem de negócios, os executivos brasileiros estão vivenciando uma transformação em como lidam com documentos. A gestão documental móvel – Mobile DMS (Document Management System em dispositivos móveis) – tem provocado uma mudança na forma como as empresas fazem a gestão documental, com foco na mobilidade.

Com colaboradores espalhados entre escritórios, home offices e viagens, a demanda por sistemas de gestão documental acessíveis via dispositivos móveis explodiu. Soluções de Mobile DMS permitem que toda a documentação corporativa – antes restrita a pastas de rede ou arquivos físicos – esteja literalmente na palma da mão dos executivos e das equipes. Esse acesso traz benefícios estratégicos: tarefas antes adiadas até a volta ao escritório agora podem ser resolvidas em minutos, de qualquer lugar.

A mobilidade tira atrasos dos fluxos de trabalho e imprime um ritmo mais acelerado aos negócios. Os ganhos de produtividade são tangíveis. Estudos estimam que empregados desperdiçam horas por dia buscando documentos em sistemas fragmentados; quando tudo está centralizado em um DMS na nuvem acessível pelo celular, essa perda de tempo cai drasticamente.

Capacitar a gestão documental móvel em larga escala só é possível graças a avanços tecnológicos recentes que tornam a experiência segura e eficiente. A conectividade 5G é um desses pilares. Com a quinta geração de redes móveis, o Brasil deu um salto em velocidade e latência de conexão, o que possibilita que arquivos pesados sejam baixados ou sincronizados quase instantaneamente no celular, viabilizando, por exemplo, abrir um desenho técnico ou vídeo corporativo no ato, sem esperas.

A ampla banda e baixa latência do 5G também suportam melhor o uso de aplicativos de DMS em tempo real, mesmo fora do Wi-Fi do escritório, reduzindo falhas de acesso e frustrações. Para empresas, isso significa que seus executivos e equipes remotas ficam constantemente conectados ao acervo documental, seja para uma videoconferência com compartilhamento de documentos ou para aprovar um fluxo no sistema ERP integrado ao DMS via nuvem.

Desafios e melhores práticas na adoção do Mobile DMS

Apesar dos benefícios claros, a implementação de um Mobile DMS em ambientes corporativos complexos não está isenta de desafios. Questões de segurança e compliance estão no topo da lista de preocupações de qualquer CIO. Permitir acesso móvel a documentos confidenciais pode soar arriscado à primeira vista – afinal, dispositivos móveis podem ser extraviados ou interceptados em redes públicas. Por isso, é fundamental adotar medidas de segurança adequadas, como criptografia de dados, controles rígidos de acesso e gestão de dispositivos móveis, mitigando riscos potenciais​.

Plataformas robustas de DMS móvel já incorporam muitos desses recursos de fábrica: dados trafegam sempre criptografados, arquivos armazenados localmente no aparelho ficam protegidos por criptografia e podem ser apagados remotamente, e políticas de acesso garantem que cada usuário veja apenas o que lhe é permitido. Conciliar mobilidade e proteção de dados é possível e necessário, mas requer um planejamento cuidadoso de TI – incluindo testes de invasão, configurações de alertas para acessos suspeitos e atualização contínua contra novas ameaças.

Outro desafio crítico é assegurar a aderência dos usuários e a integração fluida às operações existentes. De nada adianta liberar um aplicativo de DMS móvel se os funcionários não o utilizarem corretamente ou continuarem presos a antigos hábitos (como salvar documentos localmente ou enviá-los por e-mail). As melhores práticas indicam investir em interfaces intuitivas e treinamento. Um Mobile DMS deve ter uma experiência simples, quase tão fácil quanto usar um aplicativo de mensagens, para incentivar a adoção ampla. Garantir compatibilidade entre plataformas e dispositivos também é essencial – independentemente de o executivo usar iPhone, Android, tablet ou notebook, ele deve conseguir acessar o sistema.

Em ambientes corporativos complexos, o DMS não atua isoladamente –deve conversar com outras aplicações (desde suites de escritório até sistemas legados de gestão). Uma boa prática é optar por soluções de Mobile DMS que ofereçam APIs e conectores com ferramentas já usadas pela empresa, facilitando fluxos de trabalho contínuos. Por exemplo, integrar o DMS com plataformas de assinatura eletrônica permite que um contrato seja revisado no celular e já enviado para assinatura digital imediatamente. Ou integrar com o e-mail corporativo e apps de colaboração (Teams, Slack) para que compartilhar um documento seja tão simples quanto enviar uma mensagem.

Essas integrações eliminam barreiras e fazem do DMS móvel uma extensão natural do ambiente de trabalho, em vez de mais uma aplicação separada. Em suma, superar os desafios requer planejamento multidisciplinar e foco nas melhores práticas: segurança desde a concepção, usabilidade, treinamento, integração e compliance.

Organizações que seguem esse caminho estão aptas a implantar o Mobile DMS mesmo em contextos altamente regulados, tirando proveito da mobilidade sem comprometer seus padrões operacionais ou regulatórios.

Em conclusão, a mobilidade está revolucionando a gestão documental ao torná-la onipresente, ágil e integrada às estratégias de negócio. Se antes gerir documentos era sinônimo de burocracia e lentidão, agora, com um Mobile DMS bem implementado, torna-se sinônimo de celeridade e vantagem competitiva. Quem adotar as práticas corretas e investir em mobilidade segura colherá ganhos concretos em produtividade, colaboração e tomada de decisão, além de manter a conformidade em dia. Em um ambiente corporativo onde tempo é dinheiro e informação é poder, ter a gestão documental acessível em qualquer lugar pode ser o diferencial entre liderar uma revolução digital ou ficar para trás nessa nova era móvel.

(*) É vice-presidente da Access.

Ilustração: Data Storage. 

terça-feira, 8 de abril de 2025

Economia criativa funciona até mesmo onde o Estado falta

 


Economia criativa é resistência onde falta política pública

Por Wagner César (*)  

Em um país onde as políticas públicas frequentemente falham em transformar realidades, a criatividade tem desempenhado um papel que o Estado muitas vezes não consegue. Ela gera renda, preserva culturas e transforma comunidades. Esse movimento tem nome: a economia criativa. Crescendo silenciosamente, à margem das grandes decisões econômicas, ela é responsável por milhões de empregos e por iniciativas que realmente mudam vidas.

Em 2023, a economia criativa no Brasil empregava cerca de 7,8 milhões de pessoas, com um crescimento de 4% em relação ao ano anterior, segundo a Fundação Itaú e o Observatório Itaú Cultural, com base na PNAD Contínua do IBGE. No Espírito Santo, no segundo trimestre de 2024, aproximadamente 220 mil pessoas estavam no setor, representando 10,5% da força de trabalho do estado, com aumento em relação ao trimestre anterior e ao mesmo período de 2023. O rendimento médio dos trabalhadores criativos no estado foi de R$ 3.465,36, colocando-o em quinto lugar no ranking nacional de remuneração.

Esses dados são um reflexo claro do dinamismo da economia criativa, que, mesmo na ausência de um apoio institucional constante, tem demonstrado um crescimento notável, profissionalização e a geração de empregos de qualidade. Onde o mercado tradicional não chega, a criatividade se estabelece, preenchendo lacunas em regiões com escassez de oportunidades, estrutura e investimento, e, dessa forma, sustenta comunidades inteiras por meio do talento e da inovação.

Um exemplo marcante vem da aldeia indígena localizada em Ubatuba, no litoral norte de São Paulo. Lá, os moradores encontraram na economia criativa uma alternativa real de geração de renda e de valorização cultural. Por meio de visitas guiadas, os turistas conhecem trilhas, cachoeiras, casas de reza e locais sagrados da comunidade. Também podem adquirir artesanatos feitos pelos próprios moradores. A renda que entra não só garante o sustento das famílias, como é reinvestida na aldeia, fortalecendo tradições e melhorando a qualidade de vida de todos.

A experiência da aldeia de Ubatuba não é isolada. Em todo o Brasil, existem iniciativas semelhantes. Comunidades periféricas, quilombolas, artistas de rua, pequenos produtores culturais. Todos esses agentes têm utilizado a criatividade como instrumento de resistência, empreendedorismo e transformação social. São pessoas que, mesmo esquecidas pelo poder público, seguem gerando impacto, criando soluções e movimentando a economia a partir da cultura. Outro ponto importante é o papel do turismo cultural nesse processo. Quando bem articulado, o turismo impulsionado pela criatividade pode atrair visitantes, movimentar restaurantes, pousadas, lojas e serviços locais. Isso gera um ciclo virtuoso. A renda circula, novos empregos surgem e os territórios se desenvolvem de forma mais sustentável.

Para que esse potencial seja plenamente aproveitado, é fundamental que o poder público reconheça a economia criativa como uma prioridade estratégica. É urgente investir em formação, incentivar o empreendedorismo cultural, apoiar a formalização e criar políticas públicas que valorizem os saberes locais. A criatividade não se limita à expressão artística ou ao entretenimento; ela é uma fonte concreta de desenvolvimento econômico e inclusão social. O Brasil possui um patrimônio cultural vasto e um povo incrivelmente criativo. Ignorar esse potencial é desperdiçar uma das maiores riquezas do país. A história da aldeia de Ubatuba é um exemplo claro de como é possível construir soluções reais a partir da cultura. O que falta agora é que o país compreenda de uma vez por todas que a criatividade não é um luxo, mas uma necessidade.

(*) é escritor, mercadólogo e ativista social.